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Quem pode jogar pedras?

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Quem pode jogar pedras?

Dos artigos que escrevo às sextas-feiras, poucos recebem comentários dos leitores. Na maioria das vezes, os que o fazem, mais do que elogios, expressam reticências. Normalmente, elas partem de pessoas que – tudo leva a crer – não integram as fileiras da Igreja Católica, ou alimentam reservas a seu respeito. De minha parte, devo ter a humildade de aceitar também as críticas, não apenas porque me ajudam a ampliar meus horizontes culturais, mas também porque, como diz a sabedoria popular, quem escreve o que quer, ouve o que não quer!
Foi o que aconteceu também com o artigo que publiquei no dia 13 de julho, sob o título: “Não façais da religião um mercado!”.

As palavras mais iradas vieram de Marcelo R. Para ele, a Igreja Católica não deveria se pronunciar sobre temas éticos, já que seu passado deixa muito a desejar: «Fala sério, meu caro Dom Redovino! Quem é a igreja católica para falar sobre comércio? Lembra das indulgências e do período das inquisições, onde os pobres eram obrigados a aceitar o cristianismo sob pena de serem mortos? Os infelizes tinham que dar suas poucas moedas de ouro para a “santa igreja” enviar a alma dos entes queridos falecidos para o céu? A religião católica é diretamente responsável pelo atraso tecnológico, econômico e cultural do mundo! Devolva as riquezas saqueadas mundo afora pela igreja! Faça a cúpula do catolicismo comer arroz e feijão! Quanto às outras religiões, realmente devo concordar: são mercantilistas e extorsionárias como vocês!».
Na verdade, se nos prendêssemos aos erros do passado, seriam poucas as pessoas, instituições e nações a quem se poderia conceder a palavra! Não a teriam os portugueses e os espanhóis, pela violência cometida contra os autóctones da América Latina. Não a teriam os índios, pelo canibalismo praticado contra os inimigos e pela multidão de crianças sacrificadas aos deuses ou por terem nascido defeituosas. Não a teríamos nós, brasileiros, pelo morticínio, inclusive de meninos, perpetrado contra os paraguaios durante a guerra da Tríplice Aliança (1864/1870). Não a teria a Turquia, pelo genocídio do povo armênio, levado adiante de 1915 a 1917. Não a teria o povo alemão, pelo silêncio que guardou durante a 2ª Guerra Mundial (1939/1945), enquanto Hitler e o nazismo massacravam os judeus. Não a teriam os bandeirantes, pela destruição das Reduções e pelas dezenas de milhares de índios que escravizaram. Não a teriam os nordestinos e os gaúchos, pelo desmatamento operado no Mato Grosso do Sul (Estado onde resido).

Mas, vale a pena insistir na lista para detectar culpados? Numa história da humanidade marcada por injustiças e preconceitos, temos o direito de avaliar o passado com critérios de hoje? Se assim agirmos, como nos julgarão os habitantes do planeta Terra daqui a 200 anos? O passado e o presente – não quero prever o futuro – são marcados por luzes e sombras. É o que acontece também na Igreja: sendo composta de pessoas humanas, em seu seio os santos e os pecadores convivem lado a lado.

Concordo com o Marcelo ao afirmar que a Igreja deveria ter sempre praticado o que prega. Isso, porém, vale para todos, até para ele: não o conhecendo pessoalmente, não sei qual é a sua atuação por um mundo mais justo e solidário. «Quem estiver sem pecado jogue a primeira pedra!» (Jo 8,7), disse Jesus a quem, julgando-se acima e melhor do que os outros, os condena sumariamente. Se foram uma multidão os cristãos que erraram no passado – e continuam errando no presente – são também uma multidão os que se dedicaram – e continuam se dedicando – à promoção da cultura, da saúde, da justiça, da paz e da fraternidade e à defesa da dignidade humana. É por isso que são também uma multidão os que perderam e perdem a vida, perseguidos por quem se sente questionado por uma Igreja que, como Jesus, será sempre «sinal de contradição» (Lc 2,34): para uns, tábua de salvação; para outros, pedra de tropeço.
O que realmente importa é converter-se ao «amor, que apaga uma multidão de pecados» (1Pd 4,8), repara os erros do passado, dá esperança à humanidade e enternece o coração de Deus: «Haverá no céu maior alegria por um só pecador que se converte do que por noventa e nove pessoas que, por se considerarem corretas, julgam não precisar de mudança» (Lc 15,7).

Dom Redovino Rizzardo, cs
Bispo da Diocese de Dourados

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