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Terra de todos os povos?

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Terra de todos os povos?

Por Dom Redovino Rizzardo

Não é por nada que o Mato Grosso do Sul é considerado “a terra de todos os povos”. De 1940 a 2008, sua população cresceu quase dez vezes, ao passo que a do Brasil, no mesmo período, aumentou pouco mais de quatro vezes. Em 2005, 30,2% de seus habitantes haviam nascido em outros Estados – número que deveria ser duplicado se fossem elencados apenas os imigrantes com mais de 50 anos de vida.

O Estado é formado, em sua quase totalidade, por uma população pacífica e ordeira, que deseja ocupar o lugar que merece e lhe cabe. Contudo, não passa dia sem que seu solo seja manchado de sangue, por uma violência que cresce desenfreada em toda a parte, alimentada por toda espécie de paixões que se aninham no coração humano.

Foi o que aconteceu também no dia 18 de novembro. Nas primeiras horas da manhã, um acampamento indígena situado entre os municípios de Amambai e Aral Moreira foi atacado por um grupo de pistoleiros. Depois de terem dispersado a população e ferido várias pessoas, mataram o cacique Nísio Gomes, fazendo desaparecer o seu cadáver.

Como em outros ambientes do Brasil, também no Mato Grosso do Sul a vida humana ficou banalizada: ela vale menos do que o dinheiro, a terra e a droga. A violência se tornou corriqueira. Conseguiu entrar até nas famílias e nas escolas. Não poucas vezes, os próprios índios são seus sujeitos e suas vítimas. É rara a semana em que, na Reserva Indígena de Dourados, não ocorra um assassinato em decorrência da bebida, da droga e do abandono a que seus habitantes são relegados. Segundo o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), proporcionalmente, há mais mortes violentas nela do que no Iraque.

Não estou defendendo as ocupações feitas pelos índios, e muito menos afirmando que a simples demarcação de terras resolverá seus problemas sociais e econômicos. Se um grande número deles luta para construir um futuro melhor através do estudo e do trabalho (artesanato, agricultura, reflorestamento, piscicultura, etc.), como verifiquei numa aldeia de Caarapó, sei de outros que abandonaram iniciativas de autossustentabilidade para continuar recebendo cestas básicas do governo…

Mas também não posso pactuar com as expulsões perpetradas a ferro e fogo pela truculência de alguns fazendeiros. Entre os anos de 2003 e 2010 foram assassinados 253 índios no Mato Grosso do Sul. É verdade: 80% deles foi vítima da violência que grassa dentro das próprias aldeias. Mas há também os crimes perpetrados por mãos mais ou menos ocultas, que acabam impunes, já que há advogados, autoridades e instituições sempre prontas a tomar a sua defesa. Não foi por nada que o CIMI, em nota publicada após o crime de Aral Moreira, afirmou que «a impunidade recarrega periodicamente as armas de grosso calibre e joga sobre as ações dos pistoleiros e seus mandantes o manto de um Estado cada vez mais esfacelado, ausente, inoperante e inútil aos mais necessitados».

Quem participou da missa no domingo, dia 20 de novembro, lembra que o critério usado por Jesus no “Juízo Final” para nos olhar como “benditos” ou “malditos”, serão as atitudes que tomamos em relação ao próximo: «Tudo o que fizestes ao menor dos meus irmãos, foi a mim que o fizestes» (Mt 25,40). Oxalá, naquela hora, nenhum sul-mato-grossense se sinta atingido pela mesma repreensão que Deus dirigiu a Caim: «O que fizeste com teu irmão? A voz de seu sangue clama a mim. Maldita a terra que bebeu o sangue de teu irmão!» (Gn 4,9-11).

A população do Mato Grosso do Sul quer acreditar que, antes do Juízo Final (!), se concretize pelo menos uma das inúmeras promessas feitas pelas autoridades políticas para pôr fim a um estado de coisas que a todos nos envergonha e oprime. Quem proferiu a última delas, no dia 24 de novembro, foi Gilberto Carvalho, Ministro da Secretaria Geral da Presidência da República. Ele garantiu que «o Governo Federal trata como questão de honra a solução dos problemas enfrentados pelas comunidades indígenas do Mato Grosso do Sul». Para tanto, «está próximo um acordo com o Governo do Estado para se conseguir uma área delimitada para os Guarani-Kaiowá. É uma preocupação e um compromisso!».

Quando isso acontecer, o Mato Grosso do Sul será verdadeiramente “a terra de todos os povos” – incluídos os indígenas!

Dom Redovino Rizzardo, cs
Bispo da Diocese de Dourados

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